ser solitária não é o mesmo que solidão
Ela era transparente como cristal, porém também tinha o seu lado misterioso, os seus segredos, a sua essência escondida como a olhar pelo núcleo de um cristal.
Ela escreve para aliviar um pouco a sua alma, para conseguir calar as suas inseguranças e acalmar o seu inconsciente. Sempre acompanhada do seu caderno de veludo de um vermelho escuro e uma caneta preta, para que em qualquer altura ou lugar o processo de escrever a ajude a acalmar-se e reencontrar-se.
"Sou uma pessoa um pouco solitária. Quando era criança, sendo filha única, tinha a imaginação para me fazer companhia, mas a partir da adolescência passou a ser minha inimiga. A imaginação aliou-se ao inconsciente, fazendo crescer as inseguranças. Tentava estar sempre entretida com alguma atividade, a ler ou a escrever, mas o inconsciente pode ser implacável. Sempre a martelar silenciosamente nos pequenos erros cometidos, nas palavras não ditas, nas vergonhas passadas, no julgamento das pessoas ao redor, na forma como me via ao espelho. Delicadamente as inseguranças vão aumentado e apoderando-se do corpo e mente. O reflexo do espelho era um patinho feio, com um sorriso a esconder e a guardar tudo o que sentia. Foi assim durante uns anos, a criar uma imagem que não correspondia à realidade, a esconder tudo com um sorriso, a sentir uma solidão e desejar que tudo fosse diferente mas sem ser capaz de mudar isso.
O patinho feio começou a mudar e crescer, apercebeu-se de que tinha valor e pessoas ao seu lado. A imaginação deixou de ter poder e isso possibilitou a transformação numa outra pessoa. Mais confidente, mais segura de si mesma, mais consciente que a solidão que sentirá era passado."
Encostada a uma árvore a saborear a brisa de verão, ela para de escrever para olhar ao seu redor e sentir os raios de sol a baterem-lhe no corpo por entre os ramos. A brisa e a sombra da árvore minimizam o calor e os raios de sol provocam uma sensação de conforto e liberdade. Estes momentos a sós em sintonia com a natureza, fazem-na sentir feliz e realizada. Não é solidão, mas sim apenas um momento a sós, a saborear o presente e os pequenos momentos. É apenas solitária, porque os momentos longe da sociedade fazem-na reencontrar-se, libertar-se e equilibrar-se.
As pessoas raramente escrevem porque estão felizes. Escrevem quando estão tristes, amargurados, quando os sentimentos e pensamentos pesam demais dentro do seu corpo frágil, mas que já possui incontáveis cicatrizes.