- Deixa-me ir, isto não pode esperar, o tempo é agora. Sinto em todo o meu corpo que não há mais tempo a perder, a minha alma chama por isso. Tenho que ir e viver, descobrir mais de quem sou e do que sou feita.
- Não estas preparada, precisas de mais tempo. Precisas de planear melhor, ter em conta tudo o que pode acontecer, aumentar as tuas poupanças, zelar melhor pela tua segurança. Espera, espera mais um bocado, porque ainda há tempo.
Ela olhava ao espelho, completamente vidrada no seu reflexo. As suas vozes interiores gritavam uma contra a outra. Só queria silenciá-las para conseguir ouvir o seu coração. Não tinha tempo para estar a aturar-se. As lágrimas escorriam lentamente pela sua face.
Estava tudo pronto, as malas feitas e encostadas à porta. Ela estava pronta, botas de salto pretas, leggins pretas de algodão, camisola de lã branca a dar pela coxa, casaco volumoso azul-escuro.
Fecha os olhos, respira bem fundo e olha-se novamente ao espelho. Estava nua, com as lágrimas já a baterem no seu peito, punhos cerrados e com o quarto numa desarrumação na sua arrumação.
Não tinha o tempo de qualidade para ela própria, o problema era esse. Não queria enfrentar-se, era mais fácil perder-se no tempo. Precisava de respirar e olhar-se nos olhos, perguntar-se o que realmente era e o que queria. Lidar com ela própria, aceitar, respeitar, perdoar e amar.
![]()