covid: o elefante na sala sobre saúde mental
Falar do vírus é assunto que dá para mangas... Veio, ficou, e irá ficar. De mansinho até que fez rebentar a bomba e pôs o mundo em confinamento. Máscaras e gel à toda a hora. Contacto limitado. O medo a ser ligado a palavras e emergir e ficar à superfície. Mas é incrível como em tempo recorde foram elaboradas vacinas, contra o 3, 5 a 10 anos, (os testes em células, animais e depois humanos). Tem o seu senão, todos os seus efeitos secundários porque para isso seria necessário muitos mais anos de estudo. De todas as limitações, a mudança de comportamento a nível pessoal e social, o elefante na sala da saúde mental continua a existir.
Qual é o impacto? Silencioso e profundo.
Não tive a possibilidade de voltar à portugal, fui obrigada a ficar em confinamento na bélgica. Um país onde só estava há 2 meses, numa casa que dava para viver mas de pouco fornecia conforto, tinha um estágio que me permitia ter dinheiro, mas estava entre projectos e sem estar no laboratório não tinha muito trabalho. Consegui manter uma rotina, felizmente. Apanhar sol da manhã a ler ou a escrever ou a colocar aulas de cursos em dia. Yoga e pilates para manter o corpo são e uma tentativa para a mente. Ao final do dia entregava-me ao netflix, a mim mesma, aos pensamentos de que tinha passado mais um dia. A escrita e a fotografia foram os meus escapes e as minhas salvações. Sempre que ia às compras, dava uma volta pelo parque para sentir o mundo fora de quatro paredes. Sou grata por tudo isto, tinha o que tinha e fiz o melhor que pude com isso.
Aquele sentimento de tristeza, desespero, saudade que faz doer o coração, choro, solidão, frustração, raiva, impotente, estar sozinha. Houve dias maus, ligava a chorar com o pânico a tomar conta de mim (mas sem ainda saber o que era esta sensação de medo e mal-estar), a ansiedade vinha ao final da tarde e ficava pela noite. O corpo físico estava a sofrer com ter parado de ter tomado a pílula por mais de 10 anos, com a pobre alimentação que fazia, a ansiedade constante. Aguentou-se...até o confinamento ter acabado. Voltei ao trabalho, a ter vida social e tudo estava bem durante o dia. Ao contrário da noite. onde a ansiedade virava ataques de pânico, ir sair gerava ansiedade social mesmo sendo com as pessoas que passei a chamar de família e sabia que estava segura até ter que ir para casa e estar sozinha comigo e com os medos que foram crescendo durante quase 3 meses fechada no quarto. Escalou para ataques de pânico semanais, dores de estômago constantes, estar a viver com ansiedade 24 horas por dia. Foi difícil estar fechada, mas foi ainda mais ter que voltar a estar em sociedade e novamente sozinha.
Procurei ajuda e ajudou. Houve ensinamentos, levantou-se as primeiras camadas de descobrimento pessoal mais profundo. A liberdade foi dada e tirada, e com isso veio a adaptação. Só que em tempos de regras ficava-se por casa, já não fechada no quarto mas aquela ansiedade de memórias estava presente, o corpo gravou o que sentiu. Não era só a depressão sazonal. Vieram as vacinas, a 1º dose que foi suportável, a 2º dose que veio arrasar com o sistema imunitário fraca que já estava na altura.
No sofá, a recuperar da 3º dose que me trouxe uma dor de cabeça que não passa com medicação e só alivia ligeiramente com a pomada tiger, que me impede de estar confortável ou descansar, com febre que vai e vêm, e um mau estar enorme. É como estar com o tpm ou menstruada mas num nível acima, uma mulher aguenta, mas não nesta dimensão.
Adaptei-me, continuei em frente e esta realidade é o presente que pode durar anos. O meu corpo carrega o peso do trauma e a mente trouxe todas a história. A minha saúde mental sofreu e continua a sofrer. Não foi fácil e agora vejo o quão fragilizada estive. Passei a viver com a ansiedade e ataques de pânico constantes, aprendi a identificá-los e a controlar alguns. Não todos, que continuam a ser momentos pesados e difíceis. Tenho que ter cuidados com a alimentação e ter incorporado ayuerveda foi o que ajudou a não ter desenvolvido problemas. Grandes multidões e espaços pequenos trazem o pânico ao meu corpo e mente.
Tenho perfeita noção que ainda estou na ponta do iceberg, existem triggers que ainda não reconheço ou entendo que provocam os ataques de ansiedade/pânico, e todo este impacto que o elefante teve na saúde mental veio estimular. E toda esta assimilação é esmagadora!